É sabido que a família sofreu transformações com o decorrer do tempo, passando a ser cada vez mais valorizado o vínculo de afeto (e não somente o biológico). Como vocês sabem, hoje em dia é comum, também, que muitas pessoas tenham animais de estimação e prorroguem a decisão sobre ter filhos ou não.
E, se o casal possui um animal de estimação, mas decide divorciar-se, com quem fica o bichinho? E aquele que sair da residência, vai poder continuar a vê-lo com certa frequência? No Brasil, ainda não há uma legislação específica para regulamentar tais situações. O projeto de lei nº. 542/2018, que versa sobre a matéria, está em trâmite.
Apesar disso, em muitos casos a jurisprudência vem antes da legislação, pois as questões chegam ao Judiciário, que precisa decidir sobre tais demandas, mesmo não havendo previsão legal específica sobre. Assim foi que, em 2018, foi proferida uma decisão sobre o assunto, a qual foi notícia em muitos canais de comunicação, vez que se trata de um precedente em Corte Superior.
O caso era de dissolução de união estável e o ministro Luis Felipe Salomão, observando que o animal foi adquirido na constância do relacionamento das partes, bem como que estaria demonstrada relação de afeto, reconheceu o direito de visitação ao companheiro.
Afinal, animal pode ser considerado efetivamente um membro da família? Ou será apenas um objeto partilhável na ocasião do divórcio/dissolução da união estável? Neste artigo, você poderá entender os posicionamentos que existem sobre o tema!
Há dois entendimentos: um de que os animais de estimação são apenas “coisas”, e, assim, deveriam ser partilhadas como qualquer um dos outros bens na ocasião do divórcio. Isso porque a natureza jurídica deles, definida no Código Civil, não lhes atribui a qualidade de “pessoas” e não há personalidade.
O outro, representado pelo julgado do STJ (Superior Tribunal de Justiça), é no sentido de que, ainda que o animal seja considerado “coisa”, ele deve receber atenção especial e diferenciada, já que a Constituição Federal veda práticas que submetam animais à crueldade e que deve ser levada em conta a existência de vínculo afetivo entre o ser humano e seu animal de estimação.
O STJ entendeu que seria possível aplicar o instituto da composse, previsto no artigo 1.199 do Código Civil, como também, por analogia, o instituto da guarda de filhos, tratado nos artigos 1.583 a 1.590, sem estender aos animais, porém, “o atributo da subjetividade ou de alguma espécie de poder familiar, ao menos até que o legislador normatize a matéria”.
Há uma lacuna legislativa, pois a lei – até o momento – não prevê como resolver conflitos entre pessoas em relação a um animal adquirido com a função de proporcionar afeto e não riqueza patrimonial. Nesses casos, então, deve o juiz decidir “de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito”, nos termos do art. 4º da Lei de Introdução às Normas de Direito Brasileiro.
Desse modo, por analogia, poderia se aplicar o instituto da “guarda” (entre aspas, por tecnicamente esse termo ser prerrogativa de filhos menores), tendo em vista que os animais são sujeitos a custódia (jus custodiendo), por serem classificados como semoventes no art. 82 do Código Civil Brasileiro.
É importante grifar que, não se trata de equiparar os cachorros (ou demais “pets”) aos filhos, aos seres humanos. O que se busca é reconhecer apenas que nem sempre os animais devem receber o mesmo tratamento de coisas ou de objetos.
Diante da ausência de um estatuto jurídico ou regulação específica, a decisão de aplicar o direito das famílias ou o direito das coisas se definirá pela corrente à qual se filiar o magistrado/a, relativamente ao status jurídico dos animais de estimação. Dessa forma, as variações e heterogeneidade nos fundamentos das decisões podem ser enormes.
Um ponto a se destacar é que, não sendo a relação entre animais e humanos derivada da autoridade parental, não pode o juiz/a determinar de ofício o estabelecimento de uma guarda compartilhada em relação a um animal. A determinação de guarda unilateral ou compartilhada/alternada deverá suceder a iniciativa de obtenção da custódia por ambas as partes.
Mesmo quem propõe a permanência dos animais na categoria de coisas, deve aceitar que são necessárias regras mais ajustadas à realidade do animal (principalmente o animal de companhia, por exemplo, dos cegos) na sociedade contemporânea e harmonizadas com a relação afetiva entabulada entre humanos e animais, cuja feição já não é a mesma de outrora.
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Fonte: Direito Familiar
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